Dr.ª Angela Carla Zandoná Ubialli.
Em 16/09/2024, foi publicada a Lei 14.973/24, que permite ao contribuinte atualizar o valor do imóvel constante em seu Imposto de Renda para o valor de mercado, pagando imposto de renda sobre ganho de capital de 4% para pessoas físicas e de 10% para pessoas jurídicas (6% de IRPJ + 4% de CSLL). A referida lei foi regulamentada, na sequência, pela Instrução Normativa 2222 da Receita Federal.
Mas, antes de adentrar na análise da referida lei e sua norma regulamentadora, destaco que se engana quem imagina que o Governo Federal foi benevolente com o contribuinte ao permitir a atualização do valor de imóveis com a redução da alíquota do imposto sobre ganho de capital de 11% para pessoas físicas e de 5% a 12,5% para pessoas jurídicas, porque definitivamente não foi. A finalidade é meramente arrecadatória, diante da necessidade de gerar caixa para tentar finalizar o ano fiscal com as contas no ‘azul’, já que os gastos públicos estão em constante majoração.
Feita essa ressalva, confesso que, ao contrário da ampla divulgação que tem sido feita na mídia, não vejo vantagens na atualização do imóvel no Imposto de Renda nos moldes permitidos pela Lei 14.973/24 e pela IN 2222 da Receita Federal.
Primeiro, porque já existem situações nas quais o contribuinte pode se valer de isenção ou redução considerável do ganho de capital, previstas na Lei do Imposto de Renda, dentre elas: (i) a existência de redutores significativos aplicáveis a imóveis adquiridos há longa data; (ii) a utilização do produto da alienação de um imóvel para a aquisição de outro no prazo de 180 dias; e (iii) se o valor do imóvel for de até R$ 400.000,00 (…). Nesses casos, não há dúvidas de que a aplicação da isenção é mais vantajosa do que a utilização da ‘benesse’ prevista na Lei 14.973/24.
Segundo, porque a alíquota de 4% para pessoas físicas e de 10% para pessoas jurídicas não é aplicável de forma automática a qualquer caso. A lei estipula, em seu art. 8º, parágrafo único, um critério objetivo para determinar a alíquota aplicável, qual seja, o tempo decorrido da data da atualização até a data da venda do bem.
Assim, se um contribuinte (pessoa física) decide atualizar o valor do imóvel na data de hoje, 02/10/2024, só poderá se valer da alíquota de 4% sobre o ganho de capital se permanecer com o bem por um período de 15 anos contados da data de atualização. No exemplo dado, até 02/10/2039.
Ainda assim, o contribuinte não estará isento do imposto sobre ganho de capital por ter feito o ‘adiantamento’ do imposto ao se valer da Lei 14.973/24. É preciso lembrar que o fato gerador do ganho de capital é a valorização imobiliária, e, se esta ocorrer no período de 15 anos, o referido imposto será devido no momento da venda.
Há também casos em que o contribuinte (pessoa física), ao optar pela atualização do imóvel pela Lei 14.973/24, poderá vir a pagar 19% de imposto sobre ganho de capital. Isso ocorrerá se o contribuinte atualizar o valor do imóvel em 02/10/2024 e vier a aliená-lo em menos de 36 meses, pois não há previsão de abatimento do valor antecipado a título de ganho de capital.
Assim, digamos que o imóvel esteja valorado no IR/2024 em R$ 100.000,00 e seja atualizado para o valor de mercado de R$ 1.000.000,00 em 02/10/2024. Nesse caso, o contribuinte (PF) deverá recolher, à vista, R$ 36.000,00 de imposto sobre ganho de capital (alíquota de 4%).
Se esse mesmo imóvel for alienado em 02/10/2026 por R$ 1.000.000,00, o contribuinte pagará, a título de ganho de capital, R$ 135.000,00 (15%) pela operação, não podendo descontar o montante pago na atualização (R$ 36.000,00). Logo, na prática, pagará, a título de ganho de capital, o valor total de R$ 171.000,00.
Ocorrendo a alienação no período de 36 a 180 meses, o valor a ser pago a título de ganho de capital deve obedecer a uma fórmula prevista em lei, devendo o contribuinte observar a alíquota incidente na operação, que também está prevista no parágrafo único do art. 8º da Lei 14.973/24.
É claro que, em alguns casos, haverá ‘ganho’ ao contribuinte, porém em valor inferior ao que ele poderia obter se investisse o montante do imposto em uma operação financeira, sem contar que poderá se beneficiar dos redutores pelo tempo de aquisição do imóvel, caso a alienação ocorra após um período considerável, como já acontece atualmente.
Por isso, insisto que é preciso ter plena ciência da finalidade e das intenções do contribuinte antes de aderir à atualização proposta na lei em análise, pois, como diz o ditado popular, ‘não há almoço grátis’, especialmente quando se trata de ‘benefícios’ fiscais.