Nas ações de execução ou cumprimento de sentença, figuram em polos distintos, os credores e devedores. Os primeiros buscam meios para a satisfação de seu crédito, enquanto a outra parte, geralmente, busca alternativas para dificultar, postergar ou abster-se de sua obrigação.
Diversos são os pedidos para a localização de bens e valores em nome do executado, dentre os mais comuns: SisbaJud, RenaJud, InfoJud, CNIB, inscrição Serasa, etc. Contudo, muitas vezes, tais medidas restam ineficazes.
Segundo interpretação do art. 139, IV, do Código de Processo Civil, o magistrado, ao dirigir o processo, pode determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias para assegurar o cumprimento da ordem judicial, inclusive nas ações em que se objetive a prestação pecuniária.
Sob a égide do artigo mencionado, estão sendo utilizados meios atípicos de execução, consideradas, por alguns, de coerção indireta e psicológica, como por exemplo, a apreensão de documentos (CNH e passaporte) e bloqueio de cartão de crédito.
O deferimento dessas medidas, ocasionou um intenso debate sobre as condições e limites de sua utilização, sendo que o Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou sobre algumas controvérsias, como veremos a seguir.
Importante salientar, que os meios atípicos de execução não podem ser adotados de forma indiscriminada, sem balizamento ou controle efetivos.
Para a medida atípica ser deferida e adotada, deve-se observar uma ordem: i) o juiz deve intimar previamente o executado para pagamento do débito ou apresentação de bens; ii) caso não haja pagamento, serão realizados atos expropriatórios típicos; iii) havendo esgotamento dos meios diretos de execução, o juízo, mediante fundamentação de sua decisão, pode autorizar a utilização de medidas coercitivas indiretas.
Recentemente (21/06/2022), houve o julgamento do HC 711.194 pela Terceira Turma do STJ. Trata-se de dívida de honorários advocatícios sucumbenciais inadimplida desde 2006. Inicialmente o valor era de R$120.000,00; com atualização, juros e correção monetária, a quantia é superior a R$920.000,00). Após o esgotamento das medidas executivas típicas evidenciadas nos autos e com indícios suficientes de ocultação patrimonial da executada e dos demais co-executados, foi deferida a retenção do passaporte do devedor. Neste momento, o executado ofereceu quotas sociais das pessoas jurídicas de que é sócio e rendimentos de aposentadoria e pensão, para penhora. Contudo, a Desembargadora relatora exarou entendimento de que referidas quotas sociais não possuem expressão econômica, não estão livres e não são suscetíveis de penhora, inclusive diante de outras execuções fiscais e trabalhistas interpostas em face do executado. Além disso, os rendimentos de aposentadoria e pensão foram considerados insignificantes diante do valor da dívida, que somente seria quitada em mais de 50 anos. Para a relatora, o oferecimento de bem à penhora após 16 anos de execução infrutífera, ainda que insuficiente diante do contexto patrimonial e nitidamente insuficiente para adimplir a dívida, é evidência de que a retenção do passaporte do devedor está lhe causando o necessário incômodo pretendido por ocasião do deferimento da medida coercitiva atípica. O Habeas Corpus foi denegado.
Ao prolatar seu voto a ministra Nancy Andrighi, sustentou alguns pontos relevantes:
- As medidas executivas atípicas, sobretudo as coercitivas, não são penalidade judiciais impostas ao devedor, pois, se assim fossem, implicariam obrigatoriamente em quitação da dívida após o cumprimento da referida pena, o que não ocorre;
- Essas medidas também não representam uma superação do dogma da patrimonialidade de execução, uma vez que são os bens – e apenas os bens – do devedor que respondem por suas dívidas;
- As medidas devem ser deferidas e mantidas enquanto conseguirem operar sobre o devedor, restrições pessoas capazes de incomodar e suficientes para tirá-lo da zona de conforto, especialmente no que se refere aos seus deleites, aos seus banquetes, aos seus prazeres e aos seus luxos, todos bancados pelos credores;
- A medida coercitiva deve perdurar pelo tempo suficiente para dobrar a renitência do devedor, de modo a efetivamente convencê-lo de que é mais vantajoso adimplir a obrigação do que, por exemplo, não poder realizar viagens internacionais;
- Sobre a retenção do passaporte: ou o devedor realmente está em situação de penúria financeira e não reúne condições de satisfazer a dívida ou o devedor está realmente ocultando patrimônio e terá revogada a suspensão tão logo quite as suas dívidas.
No mesmo sentido o REsp nº 1.782.418/RJ, REsp 1.894.170/RS e RHC 97.876/SP.
O Superior Tribunal de Justiça assentou entendimento quanto a licitude e possibilidade de adoção de medidas executivas indiretas, desde que exauridos previamente os meios típicos de satisfação do crédito exequendo, bem como que a medida se afigure adequada, necessária e razoável para efetivar a tutela do direito do credor em face de devedor que, demonstrando possuir patrimônio apto a saldar o débito em cobrança, intente frustrar injustificadamente o processo executivo.