A grande ascensão das plataformas de comércio eletrônico, seja por facilidade de compra, menores preços, ou até em razão de fechamento dos comércios durante a crise sanitária, acaba por gerar insegurança quanto ao cumprimento dos deveres e obrigações destas empresas, principalmente no tocante ao papel dos consumidores nesta relação.
Devemos aqui diferenciar os tipos de plataforma online existentes e suas responsabilizações por eventuais prejuízos que os usuários possam sofrer.
Podemos conceituar, em linhas gerais, que a plataforma de e-commerce baseia-se na relação Business to Consumer (B2C), leia-se, empresa-consumidor, onde a empresa venderá diretamente ao consumidor determinado bem ou serviços dentro de sua plataforma. O consumidor por sua vez, entra no site desta empresa buscando o produto e/ou serviço oferecidos por esta. Existem demais tipos de relação e-commerce (empresa-empresa; empresa-governo), os chamados “B2B” e “B2G”, respectivamente, contudo não serão objetivo de análise do presente artigo.
Primeiramente, como exemplo, o Mercado Livre (provedor de internet), a priori, não se enquadra no conceito de e-commerce, tendo em vista que não fornece, estipula ou negocia condições comerciais de venda, ou retém produtos, apenas realiza a intermediação de vendas fornecendo espaço em sua plataforma virtual para aqueles que tem interesse em vender algo (produto ou serviço), e aqueles que tem intuito de comprar estes bens e serviços. Portanto, trata-se de relação consumer to consumer (C2C), leia-se, entre indivíduos consumidores, sendo a plataforma mera intermediária nesta relação (cessão de espaço eletrônico).
Neste caso o Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/14), em seu art. 3º, VI, preconiza que a responsabilização dos agentes se dará de acordo com suas atividades, ainda regula que o provedor de conexão à internet não será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerados por terceiros (art. 18).
Contudo, existe exceção, poderá o provedor responder se, após ordem judicial específica, não tomar as medidas cabíveis para tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, dentro dos limites técnicos do seu serviço (art. 19);
A plataforma será responsabilizada quando participar de toda cadeia de consumo, participando efetivamente em todo processo de venda e entrega dos produtos, sendo, portanto, responsável solidária, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor.
O Marco Civil da Internet, assegura a aplicação das normas de proteção e defesa do consumidor nas relações consumeristas realizadas na internet, quando destas configurar a relação de consumo: fornecedor e consumidor (Destinatário Final).
Existe ainda, entendimento nos Tribunais Superiores que reconhece a responsabilidade solidária da empresa de pagamento pela não entrega do produto, pois integra a cadeia de serviços, conforme disposto no AREsp 766.570 do STJ.
A regulação das relações de consumo na internet ainda encontra baliza no Decreto nº 7.962/2013 (Lei do E-commerce), no qual regulamenta a compra de produtos e serviços no âmbito das relações digitais, garantindo a clareza das informações prestadas; atendimento facilitado e direito de arrependimento aos consumidores.
O primeiro direito assegurado ao consumidor digital é o da clareza das informações e dados da empresa vendedora, em local de fácil visualização e destaque, os principais são: Nome empresarial; número de CNPJ ou CPF; endereço físico e eletrônico e demais informações para localização e contato; características essenciais do produto ou serviço; discriminação do preço; condições integrais da oferta; modalidade de pagamento e prazos para entrega do produto; e demais informações desde que sejam claras, completas e precisas a respeito do produto ou serviço prestado, assim disposto no art. 2º da Lei do E-commerce.
Ainda, existe a obrigação dos vendedores em fornecer atendimento facilitado ao consumidor, cabendo a plataforma disponibilizar o contrato, manter canais de atendimento adequados e eficazes; utilizar mecanismos de segurança para conservação dos dados do consumidor, dentre outros.
Assim como existe o Direito de Arrependimento, o qual garante que todo consumidor que realizar compras por meio digital tem o direito de devolver o produto, independentemente de comprovação dos motivos que o levaram a desistir da compra, devendo o vendedor realizar a devolução imediata dos valores pagos.
Contudo deve-se respeitar o prazo legal para tal, qual seja, 7 (sete dias) a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, conforme abarcado no art. 49 do CDC, assim como no art. 5º do Decreto nº 7.962/2013.
O consumidor poderá exercer seu direito de arrependimento pela mesma ferramenta utilizada para contratação, devendo o fornecedor informar de forma clara e ostensiva, os meios adequados e eficazes para o exercício de arrependimento por parte do consumidor. Inclusive, comunicando imediatamente a instituição financeira ou à administradora do cartão de crédito para efetuar o cancelamento da compra na fatura, e proceder com o devido estorno do valor pago, nos casos de efetivação do pagamento, assim disposto no art. 5º do Decreto nº 7.962/2013.
Neste ponto, que os consumidores, ora usuários, devem se acautelar de todas as provas possíveis, eventuais contratos que possam ter assinado, ou a simples manifestação de vontade ao declarar-se “ciente” no contrato de adesão (art. 54 do CDC), se possível, verificar quais são os termos de isenção de responsabilidade da plataforma (arts. 25,28,50,51 do CDC).
Toda e qualquer prova coletada1, poderá servir de base legal para fundamentar a má prestação de informação, ou omissão, por parte do vendedor, fazendo com que este responda pelo incidente causado (art. 47 do CDC), ressalvando que – em caso de dúvida – a Lei consumerista protegerá o consumidor, cabendo ao vendedor digital o ônus de afastar sua responsabilidade, conforme abarcado no Art. 6º, inciso VIII, do CDC.
Não há dúvidas que a facilidade de comprar na internet acaba por não desconfiarmos de certas ofertas, contudo não se pode disseminar o pensamento que a “internet é uma terra sem leis”, o consumidor estará devidamente tutelado perante o ordenamento jurídico.
Problemas com prestações de serviços ou produtos são corriqueiros até nas relações pessoais, neste ponto importe salientar que existem canais de reclamação e proteção do consumidor nos meios digitais (PROCON; CONSUMIDOR.GOV.BR; RECLAME AQUI, etc), que deverão ser acionados, inclusive nos canais de comunicação diretamente com a plataforma digital, e em sendo infrutífero, caberá ao consumidor lesado a busca de seus direitos perante a justiça, com auxílio de profissionais advogados para solução do problema.
Certamente os empresários mais criativos tiveram que se adaptar ao mundo digital para sobreviver e/ou expandir seu negócio durante a pandemia, e as plataformas e-commerce são ótimos negócios, tendo em vista que reduzem custos e aumentam as vendas atingindo um maior número de clientes, contudo, principalmente pequenos e médios empresários, devem estruturar seus negócios a fim de evitar problemas quanto a legislação consumerista bem como adequar-se às leis específicas que regem o comercio eletrônico, em especial a Lei geral de Proteção de Dados (LGPD).
O artigo teve por escopo apresentar cautelas e Leis existentes que o consumidor poderá se valer na busca de seus direitos, afastando sentimento de impunidades das plataformas de comércio eletrônico, porém, existem riscos quanto a eventuais golpes que merecem outro tipo de cuidado, qual seja, notar se o link realmente condiz com a página da empresa que ofertou, verificar se é possível identificar o vendedor do produto, desconfiar de ofertas com preços muito abaixo do mercado, dentre outros.