Dr. Lincoln Fagundes.
Como já tínhamos observado em outras anotações feitas sobre as sociedades comerciais, anos de prática repetitiva no aproveitamento de modelos confinaram os atos constitutivos (como regra geral) a uma forma simples, que contém o básico; às vezes nem mesmo o necessário. A facilidade do “aproveitamento” estimula a reprodução de modelos de contrato social sem quaisquer ajustes por muitos anos; em alguns casos até décadas de desatualização são perpetuadas nos registros da Juntas Comerciais.
Cada sociedade tem sua própria identidade, determinada inicialmente pelo vínculo que une os sócios quando se dispõem a reunir esforços para dar vida à sociedade empresária. Os sócios podem ser da mesma família, ou amigos, ou colegas da mesma faculdade, ou de profissões que se complementam ou se integram para a busca do objetivo comum.
Esses vínculos estão sujeitos ao curso da vida. E como a vida acontece e pode mudar o equilíbrio e a harmonia que existia no início, é no contrato social que todos os sócios devem colocar sua segurança, estipulando as regras que disciplinam o sucesso do empreendimento (como a distribuição dos lucros, por exemplo) ou as consequências de eventual fracasso do esforço por eles envidado.
Existem inúmeros mecanismos que, colocados nas cláusulas contratuais, podem evitar grandes dores de cabeça e muitos litígios. Um deles (entre diversos outros) é aquele que disciplina a sucessão de um sócio, quando ele deve ser substituído no contrato social. E os eventos são muitos: falecimento, incapacidade, exclusão do quadro social ou até mesmo a hipótese de dissolução do casamento ou da união estável, com partilha de bens – entre os quais estejam as cotas sociais.
É possível estabelecer condições específicas para a substituição do sócio falecido, incapacitado, interditado, retirado ou excluído, pelos seus herdeiros e sucessores, incluindo ex-cônjuges e ex-companheiros. Um bom contrato social cria todas as condições e traça todo o caminho a ser seguido para a sucessão ou substituição do sócio, tratando com detalhes as regras, condições, restrições, vedações, forma de pagamento ou indenização das cotas que pertenciam ao sócio a ser sucedido ou substituído.
Pode-se, por exemplo, criar classes de cotas sociais, com direitos e obrigações distintos, assegurando regras diferenciadas para cada caso, inclusive vedando o ingresso de herdeiros e sucessores no quadro social (indenizando-os por essa vedação). No caso de integrantes do quadro social que tenham cônjuges ou companheiros, pode ser inserida, por exemplo, cláusulas semelhantes a estas (lembre-se que cada caso pode exigir um conjunto de regras específicas):
No caso de dissolução de casamento ou união estável de sócio, qualquer que seja o regime de bens escolhido pelos cônjuges ou companheiros, independentemente do motivo ou das razões que lhe derem causa, a partilha das quotas sociais não assegura a seu titular o ingresso nos quadros sociais, como forma de preservar os vínculos anímicos que determinaram a criação, constituição, desenvolvimento e permanência dos sócios no exercício da atividade empresária.
O cônjuge ou companheiro que, na partilha de bens, for atribuído o direito sobre quotas da sociedade empresária, será indenizado pelo valor a elas equivalente, através do mecanismo previsto na cláusula “x” (balanço especial para apuração de haveres), mediante a apresentação, ao Administrador, do formal de partilha, carta de sentença ou ordem judicial que tenha sido expedido para assegurar o cumprimento da decisão que colocar fim ao casamento ou união estável e respectiva partilha de bens.
Como se disse alhures, procure um advogado e modernize seu contrato social. O custo da prevenção é menor que o do litígio. E se mesmo assim o litígio não puder ser evitado, pelo menos um bom contrato social pavimenta uma via segura para um resultado previamente estabelecido pelos sócios.